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Ao longo da história da ficção científica, obras-primas variaram entre dois polos criativos: de um lado, aquelas que se esforçam em manter verossimilhança com o conhecimento científico vigente, como Star Trek, que antecipa tecnologias exóticas com base teórica plausível; de outro, aquelas que se apoiam em alegorias ou estruturas mitológicas travestidas de ciência, como Duna, de Frank Herbert.
A obra Duna é frequentemente considerada uma das mais importantes da literatura especulativa do século XX. Seu escopo é grandioso: envolve ecologia, religião, política e genética. Contudo, ao analisarmos Duna com o rigor da plausibilidade científica, a proposta levanta inconsistências profundas, sobretudo na concepção do planeta Arrakis e seus famosos vermes gigantes.
Um deserto inverossímil
Arrakis, planeta completamente árido, sem vegetação, sem fauna visível e sem precipitação conhecida, ainda assim abriga criaturas colossais com comportamento altamente energético: os Shai-Hulud, os vermes-da-areia.
Esses seres, com centenas de metros de comprimento, deslocam-se com velocidade imensa através de um meio fisicamente hostil como a areia. Tal conceito exige reflexão. Em termos biofísicos, a movimentação em areia densa exige força descomunal, proporcionalmente maior que o necessário em água, por exemplo. Para um animal de tal porte se locomover em ritmo acelerado por este meio, seria necessário um consumo energético equivalente ao de várias ogivas nucleares por semana, o que pressuporia uma fonte alimentar e metabólica inexistente no planeta. Não há biomassa visível que sustente esse metabolismo, tampouco há ciclos ecológicos que justifiquem a longevidade e reprodução desses seres.
Trata-se, portanto, de um paradoxo termodinâmico: os vermes de Duna seriam máquinas de movimento perpétuo disfarçadas de vida. Na realidade física conhecida, tais entidades não poderiam existir sem violar leis fundamentais da conservação de energia.
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Ficção científica ou mito ecológico?
Apesar do fascínio gerado por Duna, é importante reconhecer que a obra não se alinha ao rigor da ficção científica "hard", aquela que propõe futuros possíveis a partir da extrapolação da ciência conhecida. Duna opera mais como alegoria teológica e ecológica do que como especulação científica crível.
Como observa o editor deste artigo (cuja opinião pessoal se apresenta aqui de forma deliberada): “Gosto muito de ficção científica, mas ela precisa ser minimamente plausível. Mesmo quando depende de ciência ainda inexistente, como em Star Trek, há um esforço conceitual honesto. Já Duna não é nada plausível. Trata-se de uma obra mítica e exotérica, e não científica.”
Comparações com outras obras
Por isso mesmo, talvez seja mais confortável consumir obras como Harry Potter ou O Senhor dos Anéis, onde a suspensão da descrença é implícita e voluntária. Tais universos não alegam ser científicos; não tentam justificar a magia com pseudociência ou dispositivos simbólicos revestidos de linguagem técnica.
Mesmo em Star Wars, essa distinção é clara, ao menos nos episódios clássicos: a Força, enquanto elemento místico, não é explicada nem disfarçada como ciência. Apenas quando os “midichlorians” foram introduzidos nos episódios posteriores é que parte do público se sentiu traído: tentou-se racionalizar o irracional, e esse erro custou credibilidade à narrativa.
Ficção e honestidade narrativa
Bem, as pessoas que valorizam a história e a ciência entendem que essa distinção entre fantasia e ficção científica não é meramente estética, é também ética e educacional. Assim, a honestidade da narrativa torna-se, portanto, um critério essencial. É perfeitamente legítimo que uma obra seja fantasiosa, mas é incoerente que se apresente como especulação científica quando carece de sustentação mínima. Em um momento em que a ciência sofre ataques constantes e a desinformação prolifera, é mais importante do que nunca que a ficção científica cultive uma relação responsável com o conhecimento.
Então, aos que conseguem suportar obras como Duna, me desculpem, mas não tenho outra designação a essas obras além de Lixo Intelectualóide.
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